RAILTON'S NOT LIAR

"Compre coisas para uso, não para status. Rejeite aquilo que possa te viciar. Prefira doar a acumular. Recuse deixar-se influenciar pela propaganda. Aprenda apreciar coisas sem possuí-las. Aprecie mais a natureza. Desconfie dos que dizem: 'Compre agora, pague depois!' Quando disser algo, lembre-se dos preceitos de Cristo sobre lisura e honestidade. Rejeite qualquer coisa que provoque opressão em outras pessoas. Evite tudo aquilo que te desvia de teu principal objetivo". [Ética Quacre]

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Local: São Miguel Paulista, São Paulo, Brazil

13.12.06

Ainda Tabor


Por Kenneth Rexroth

Freqüentemente é dito que foi a Revolução Francesa que inventou o exército nacional, o levée en masse de todo um povo. Seu verdadeiro inventor foi Jan Zizka. Embora os taborites formassem o núcleo de uma permanente força de luta, cada cruzada do imperador e do papa reunia uma grande maioria de checos. Zizka introduziu métodos notavelmente modernos de combate que propiciavam um elevado poder de fogo, o exército taborite foi o primeiro a usar sistematicamente a artilharia como principal braço tático. As tentativas de invasão tiveram como resposta uma profunda contra-invasão no território inimigo, desde o princípio a pilhagem exerceu uma parte importante nos suprimentos de Tabor. Zizka nunca pôde controlar completamente as minas de propriedade alemã, ou a cidade de Pilsen que permaneceu como reduto romano. Inicialmente, a maioria dos trabalhadores eslavos que se levantaram em revolta foram derrotados por mercenários alemães. Em Kutna Hora dezesseis mil pregadores juntamente com seus seguidores foram mortos e lançados nas minas.

Zizka iniciou sua carreira cego de um olho e incidentalmente uma flecha cegou seu outro olho. Ele estava completamente cego quanto travou suas últimas batalhas. Ele morreu em 1424 de uma infecção na véspera de uma conquista planejada da Morávia e Silésia. Sua vaga foi ocupada por Procopius que derrotou os alemães em duas grandes batalhas em 1427, os exércitos da Boêmia se tornaram o terror da Áustria, Hungria, Silésia, Saxônia, Brandenburgo, Palatino, e Francônia.

Os exércitos taborites simplesmente cessaram de invadir território inimigo e passaram a conquistá-los, ou seja, deixar guarnições nas cidades e castelos que capitularam. A Boêmia revolucionária ameaçava controlar toda Europa Central. O Papa Martin V convocou um conselho geral em Basel no ano de 1431 para lançar outra Cruzada, que novamente amargou uma derrota opressiva. Os emissários do papa, o imperador, e o conselho iniciaram negociações secretas com os utraquistos, que em nenhum aspecto eram revolucionários no sentido econômico ou social e que constituíam uma das mais instáveis alianças com a Tabor comunista. Os próprios taboritas, inábeis em conquistar o apoio dos camponeses, introduziram uma requisição forçada de alimento, primeiro para o exército e para as cidades, e depois para o estabelecimento de um estilo próprio de exação semi-feudal. Mais de quinze anos de vitórias contínuas se passaram e o próprio exército dava sinais de degeneração, enchendo-se de aventureiros vindos de toda Europa. Eventualmente os taboritas acabaram isolados e derrotados em 30 de maio de 1434, perto da Lipânia na Boêmia quando treze mil de um exército de dezoito mil foram mortos. Tanto Procópio o Grande, como seu tenente em chefe, Procópio o Pequeno caíram naquela batalha.

Os utraquistos, Papa Alexandre VI, e o Imperador Sigismund concordaram em negociar as bases dos Artigos de Praga, e em 1436 eles foram aceitos em toda parte de uma forma ambígua e modificada que permitia o uso opcional do rito romano pela Missa. A Igreja Nacional da Boêmia tomou a forma de uma espécie de igreja mista, unindo o rito ortodoxo com a comunhão com Roma, até depois da Batalha da Montanha Branca em 1620 na Guerra dos Trinta Anos. A partir dessa data essa prática foi abandonada e a obediência a Roma completamente restabelecida. Os próprios utraquistos capturaram Tabor em 1452 quando os militantes taboritas foram forçados a uma existência undergroud, para reemergirem como anabatistas e outras seitas radicais da Reforma iniciada por Lutero. Os pacifistas e os mais estritos comunistas religiosos fundaram a Unitas Fratrum, também conhecida como Irmãos Checos, Irmãos Moravianos, ou Irmãos Unidos, que existem até hoje. Os huteritas também trazem sua ascendência de Tabor.

As contínuas cruzadas papais e imperiais forçaram a formação de uma frente unida e ampla nos grupos de dissidentes reformistas e revolucionários da Boêmia. Sempre que a pressão externa relaxava, essa unidade era demolida pelo partidarismo, às vezes alcançando o ponto de conflito armado. Estas divisões eram definidas claramente por linhas étnicas e de classe.

A maioria dos nobres, ricos comerciantes alemães e proprietários de minas eram pró-Roma. Muitos deles deixaram o país. Outros conseguiram estabelecer-se em pequenos enclaves que nunca foram incorporados pelo estado boêmio revolucionário. A razão disso é que na verdade não havia qualquer estado boêmio revolucionário, nem mesmo um, unificado em termos de uma entidade política em terras checas. Os nobres e magnatas checos somaram-se a alguns alemães formando uma ala direitista no partido utraquista juntamente com o arcebispo e a Rainha Sofia. Para eles os Artigos de Praga não eram um programa mínimo mas um programa máximo. Uma vez secularizada a propriedade da Igreja eles permaneceram socialmente conservadores, bastante contentes com seus privilégios feudais escorados por monopólios e franquias, nada diferente da classe dominante inglesa do tempo de Henry VIII.

No começo da revolução, com o primeiro cerco de Praga, grande parcela do poder político se transferiu para as mãos da classe dos artesãos. Checos em quase sua totalidade, com exceção de certos profissionais como os ourives, eles se aliaram com pequenos nobres checos como Jan Zizka e com a maioria da classe média baixa, que representava um número considerável. Eles eram os militantes utraquistos. Para eles os Artigos de Praga eram um programa mínimo. Esta aliança era antipapa e não tinha nenhuma intenção de restaurar o catolicismo romano, visava uma Igreja Católica livre na qual o papa seria apenas um bispo de Roma, um bispo igual aos demais. Eles rejeitaram a doutrina romana da transubstanciação. A maior parte de seus clérigos adotara a doutrina de Wycliffe da permanência, ou seja, de que o pão e o vinho permanecem inalterados depois da consagração, de forma que o corpo e o sangue de Cristo apenas estão presentes espiritualmente, “como em um espelho”. Eles também rejeitaram a idéia de que a Missa era sagrada e a interpretaram como sendo essencialmente uma comunhão espiritual, um ato congregacional. Eles rejeitaram a estrutura social e econômica do feudalismo; embora começassem a desenvolver uma forma mercantil de capitalismo, sua base no futuro, eles estavam indefinidos sobre o que colocar em seu lugar. Politicamente eles eram democratas, embora líderes como Jan Zizka lentamente introduzissem lideranças da elite clerical, pequenos nobres, e cidadãos prósperos e educados.

O século XV foi uma época de inflação e de instabilidade econômica, especialmente na Boêmia. Praga desenvolveu uma grande classe de desempregados, como também um submundo de semi-criminosos. Tais pessoas, juntamente com os trabalhadores pobres, formavam um proletariado lumpen sempre pronto para revoltas, funcionando como o pavio da extrema esquerda.

Com o passar do tempo, com as notícias sobre a revolução na Boêmia se espalhando pela Europa, os sectários e hereges migraram para Praga — primeiramente das cercanias da Bavária, do Tirol, e da Renolândia, e eventualmente de locais longínquos como a Lituânia, Inglaterra, e Espanha. Um dos líderes da fraternidade Oreb era um lollardo inglês, Peter Payne. Após o estabelecimento das comunas de Tabor e Oreb, esta migração se transformou em uma inundação. Aparentemente todos os excêntricos e psicóticos religiosos deslocaram-se para a Boêmia. Em 1418 quarenta refugiados de Lisle e Tournai chegaram em Praga fugindo da violenta perseguição em seus países. Os primeiros foram os picardos. Os pikarti, como eram chamados, deram seu nome às formas mais extremas de revolta.

A reação à revolução boêmia no resto da Europa não foi diferente da reação aos red hunts e white terrors do século XX. Os hereges e cismáticos que tinham sido tolerados ou ignorados como inconseqüentes pelo Estado, em toda parte passaram a ser caçados, enviados à fogueira, ou linchados pela turba. Aqueles que puderam fugiram para a Boêmia, onde acreditavam que o paraíso terrestre estava em processo de realização. Todos esses diferentes elementos formaram uma classe, a classe daqueles que não tinham mais nada a perder. Contudo, eles não foram outra coisa senão o coração e a alma da extrema esquerda. Seus líderes e porta-vozes eram monges renegados, clero secular anterior, e pessoas alfabetizadas da classe média baixa.

Após seu início, a revolução boêmia não apenas foi deslocada de sua base camponesa, como veio a perder o apoio entusiástico dos seus seguidores camponeses, cuja atitude tendeu mais ao consentimento passivo do que à oposição ativa. Os camponeses estavam interessados na abolição das exações feudais, na redistribuição da terra, e na supressão das incipientes tendências à servidão que atingiria seu ápice depois da Reforma de Lutero. Uma vez conquistados esses objetivos, os camponeses perderam seu interesse na revolução, tornando-se conservadores pelas suas próprias conquistas. Considerando que nem Praga nem Tabor foram capazes de desenvolver novas formas efetivas de produção econômica, a revolução nas cidades foi forçada a retirar recursos do campo, e no caos econômico foi incapaz de proporcionar um retorno adequado ao valor recebido. A restauração do papa e do imperador significou um retorno ao feudalismo. A continuação de seus novos senhores no poder significou novas exações. Os camponeses permaneceram passivos.

A economia de Tabor foi chamada pelos historiadores posteriores de comunismo de consumo, não de produção, mas é difícil compreender como, durante tão longo período, os dois puderam ser mantidos separados. Há recentes estudos sobre o grau de socialização da produção em Tabor mas todos eles ainda estão em checo. Tabor controlou algumas das principais minas de ouro daqueles dias na Europa e sua produção parece ter ocorrido em uma base completamente comunista. Quando a comunidade estava no comando e quando comunidades afiliadas se estabeleciam em outros locais, grandes cofres eram colocados no centro da cidade, as pessoas vendiam todas suas propriedades e colocavam o dinheiro e suas jóias, se possuíssem, no cofre, e posteriormente também seus salários, aparentemente recebidos pelo trabalho efetuado em seus antigos empregos ou comércio à sua moda. A riqueza acumulada era distribuída igualmente para todos os cidadãos da comuna. Como as guerras hussitas foram mais movidas pela pilhagem, elas se expandiram mais pelo saque do que pela conversão, por essa razão as primeiras invasões ocorreram em território alemão. É difícil compreender como essas coisas funcionavam. Historiadores anticomunistas defendem uma grande semelhança àquilo que é chamado de “comunismo de brigand” do tipo que se desenvolveu nas comunidades hereges muçulmanas no Oriente Próximo. A evidência geral, por outro lado, indica que a vida em Tabor, Oreb, e outras comunas transcorreu de uma forma bastante normal, na forma de um comunismo produtivo, e que, considerando as dificuldades, não foi de forma alguma parasitário, ou certamente não mais do que o feudalismo decadente que substituiu. Aqueles que acreditavam em um comunismo puramente parasitário foram expulsos da cidade.

Assim surge o famoso Adamites cuja vida é supostamente retratada no quadro de Hieronymus Bosch, O Paraíso Terrestre. Ele foi celebrizado em nossos próprios dias pelo Big Sur and the Oranges of Hieronymus Bosch de Henry Miller; por toda parte da América jovens transviados se aglomeram nas rodovias, pedindo carona para Adamite que promete uma terra chamada Grande Sul, que eles descobrem consistir de um conjunto de montanhas escarpadas diante do mar, povoadas por nativos hostis que aparentemente sabem dizer apenas duas palavras no idioma inglês: “Move on”.

A maioria dos taborites, a Fraternidade de Oreb, e seus aliados na Nova Cidade de Praga chegaram logo a um consenso geral na revolução. Eles aceitaram a Bíblia numa combinação das doutrinas wycliffitas, waldensianas, e do Livre Espírito. A Bíblia era a autoridade exclusiva de fé e prática; os credos e as traduções da Igreja eram apenas corrupções, da mesma forma que seus ritos e cerimonias, a sagrada Missa, indulgências e orações pelos mortos, orações pelos santos, confissão auricular, extrema unção, batismo de crianças, e todos acessórios como crisma, bênçãos, água benta, vestuários de Missa, imagens, dias santos, tradicionais cantos de Missa e ofícios de oração. Todas essas coisas negavam a vida da Igreja apostólica. Aquelas pessoas acreditavam, como os waldenses, que o ministério e a autoridade de um padre em pecado era inválido. E não apenas isso, caso fosse necessário, qualquer leigo poderia celebrar a Eucaristia ou ouvir confissões.

A maioria dos militantes, ao longo da história dos dissidentes, foram milenaristas extremados. Eles acreditavam que a Segunda Vinda de Cristo (disfarçado de bergantim) e a destruição universal do mundo mau aconteceria quase imediatamente, primeiramente em 1420; e quando a data passou, foi adiada para mais alguns anos. Em preparação para a vinda do reino era dever da fraternidade dos santos encharcar suas espadas com o sangue dos malfeitores, realmente lavar as mãos com sangue. Após a destruição por atacado, assim como em Sodoma e Gomorra, Cristo apareceria no topo de uma montanha e celebraria a vinda do reino com um grande banquete messiânico para todos os crentes.

Enquanto esse dia não chegava, os taborites antecipavam essa comunhão dos santos promovendo grandes ajuntamentos próximos às colinas e montanhas onde a Eucaristia se tornava um massivo ágape ou festa do amor presidida pelos líderes militares ou religiosos como faziam os messias sacerdotais e reais do Qumran.

No reino todos os sacramentos e ritos seriam dispensados e substituídos pela presença real de Cristo e do Espírito Santo, todas as leis seriam abolidas, os eleitos jamais morreriam, e as mulheres iriam parir crianças sem dor e sem relações sexuais prévias. Em 1420 os taboritas quebraram todas as conexões com a Igreja Católica pela eleição secular e pela ordenação de bispos e padres.

A maioria dos taboritas foi extremamente puritano em sua conduta pessoal, mas uma minoria, influenciada pelas doutrinas do Espírito Livre de Pikarti, acreditava que o milênio já havia chegado. Eles compunham o reino dos eleitos, e para eles todas as leis tinham sido abolidas.

Quatrocentos deles foram expulsos de Tabor em 1421 e vagaram nus pelos bosques, cantando e dançando, reivindicando estar no estado de inocência de Adão e Eva antes da queda. Com base nas observações de Cristo sobre as meretrizes e os publicanos, eles consideravam a castidade um pecado e aparentemente passavam a maior parte de seu tempo em contínuas orgias sexuais.

Jan Zizka, que já tinha se retirado da Fraternidade de Tabor, mudou-se para Oreb, uma comunidade menos extremada, passando o resto de sua vida caçando-os. Várias centenas fugiram e se estabeleceram em uma ilha em um rio ao sul da Boêmia, baseados nessa ilha passaram a invadir os bairros vizinhos, incendiando igrejas, matando padres e todos aqueles que opunham resistência. Após um breve cerco Zizka invadiu a ilha e exterminou a todos exceto um prisioneiro que, após escrever uma confissão completa de sua doutrina, foi queimado e suas cinzas lançadas ao rio.

Esse foi o fim da extática e orgiástica comuna dos adamitas. Acusações de desregramentos sexuais e cerimonias ultrajantes, como também assassinato e roubo, foram comuns na longa história da heresia, tais acusações são usualmente tidas como fantasias oriundas das mentes neuróticas de inquisidores celibatários. Mas a história dos adamitas não vem dos inquisidores, mas de homens que foram os próprios hereges revolucionários, que conheceram intimamente os adamitas, e que não tinham nenhuma razão para acusá-los falsamente. As crenças e conduta dos adamitas diferem daquilo que conhecemos dos vários grupos do Espírito Livre no resto da Europa apenas quando comparamos essas crenças e condutas à luz da liberdade de ação brevemente esboçada pelos adamitas em uma situação revolucionária.

Além das secessões de Tabor, com Zizka à direita e os adamitas à esquerda, aqueles que se opuseram à pregação da violência desenfreada se retiraram sob a liderança de Pedro Chelsicky para uma área rural da Boêmia e fundaram uma comunidade pacifista, rejeitando todo uso da força. Para Chelsicky, o poder político e o Estado existe apenas como um mal necessário, como um resultado do pecado original, para manter a ordem no mundo fora da comunidade dos verdadeiros cristãos, onde todas as relações são governadas pela paz e pelo amor. A comunidade que ele fundou não tinha qualquer organização externa; o único laço era o amor e o exemplo da vida de Cristo e dos apóstolos. Estes pacifistas extremados sobreviveram a todas as revoluções e contra-revoluções da reforma boêmia, para se tornar o Unitas Fratrum, os Irmãos Checos.

A vida em Tabor provavelmente teve uma glória especial, a glória de uma sociedade transfigurada, onde a vida era vivida de uma forma tão exultante que se aproximava da loucura. A comunhão era o acordo diário de milhares de pessoas que cantavam ao ar livre nos campos, onde celebravam vastos encontros religiosos no topo das montanhas, com exércitos retornando da batalha, em triunfo, carregados de pilhagem e empunhando troféus como mobílias luxuosas de cardeais e reis, com multidões dançando pelas ruas, com centenas de milhares de inimigos fugindo por cima do gelo quebradiço, com exércitos marchando ao som de hinos em uníssono, com o rugido dos vagões férreos e das rodas dos canhões, com um cálice dourado, em vez de uma bandeira, acima de suas cabeças.

Tabor foi o monte onde Barak e Débora juntaram os anfitriões que aniquilaram Sísera, imortalizado em um dos grandes poemas da Bíblia; mas os taboritas também acreditavam que o Monte Tabor foi também o monte da transfiguração de Cristo, o Monte das Oliveiras onde ele pregou o sermão do apocalipse em Marcos 12 antes de começar sua marcha para a crucificação; e finalmente era a montanha da qual ele ascendeu para o céu. Todas essas coisas simbolizavam a natureza da vida vivida em Tabor.

Platão, São Thomas More, Campanella, Harrington, Bacon, todos tentaram imaginar sociedades nas quais a oportunidade para aquilo que a Igreja originalmente chama de pecado seria severamente inibida, onde seria praticamente impossível aos homens procurarem por bens menores imediatos em vez de um último maior bem. Tabor em seus primeiros anos resolveu o problema da utopia negando isso. Os taboritas foram os primeiros a tentar fundar uma sociedade no princípio de que a liberdade é mãe, não filha da ordem. Eles tiveram sucesso por causa de suas contínuas guerras. Na realidade, sem perceber, eles se tornaram uma teocracia militar.

Se o socialismo em um país é deformado e aleijado, o comunismo em uma cidade é impossível em qualquer período de tempo. Cedo ou tarde as amarras da sociedade se afrouxarão, mas o mundo lá fora não. Sempre se espera que isso aconteça, mais especialmente em tempos de paz. Tabor nunca foi capaz de balancear seu comunismo popular de consumo com um comunismo organizado e planejado de produção, nem de trocar bens entre comunas urbanas e comunas camponesas. Por aquele tempo foi amplamente apregoado e acreditado que os checos, quando colonizaram a Boêmia, eram comunistas e que os taboritas foram apenas os restauradores da comunidade original eslava. Isto provavelmente foi verdade. Comunas agrícolas funcionais que foram revivificações das primitivas comunidades camponesas eslavas, como as comunidades russas mir que remontam às aldeias neolíticas, devem ter existido. Quando a Contra-reforma esmagou a degenerada Igreja Utraquista Boêmia, foi o comunismo campônio dos huteritas e dos Irmãos que sobreviveu. A escravidão se estabeleceu na Boêmia em 1487 e alcançou sua forma mais extrema após a Revolta dos Camponeses na Alemanha e a Reforma de Lutero.

Extraído de http://www.ebooksbrasil.org/eLibris/comunalismo.html