Auge e queda da crítica à sociedade espetacular
A Internacional Situacionista by Andrés Devesa -
Fahrenheit 451 Tuesday, Nov 15 2005, 6:54pm
andresdevesa@gmail.com
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Auge e queda da crítica à sociedade espetacular
Uma análise crítica da história da Internacional Situacionista, seu desenvolvimento e propostas como movimento antagonista e sua decadência e assimilação por parte do sistema.Da luta de classes ao “Estado do Bem-estar”. O contexto histórico da Internacional Situacionista.
“Saber liberar-se não é nada; o árduo é saber ser livre…”
André Gide[1]
Faz já muito tempo que aquele fantasma que uma vez percorresse Europa dorme o sonho eterno nas frias catacumbas da História. Pouco fica da recordação da intensa agitação revolucionária que golpeou à velha Europa desde que o 28 de setembro de 1864 nascesse a primeira Internacional até maio de 1937 em que morreu a última esperança revolucionária nas ruas de Barcelona, sob as balas da contrarrevolución estalinista. Um conjunto de símbolos dispersos, uma memória distorcida e uma história frágil e freqüentemente manipulada é tudo o que conservamos desse “primeiro assalto proletario à sociedade de classes” que sucumbiu arrollado pelas rodas de aço do inevitável avanço do capitalismo. A esse “primeiro assalto” seguiu um “segundo assalto” que de novo fez tremer os alicerces do capitalismo. Mas o camaleón capitalista voltou a dar um giro de porca mais do que fez cair sobre a lona a seu adversário e nos atou ainda mais a nossa miséria. A história da luta contra o capital é a história uma derrota contínua. Mas sobre as cinzas dessa derrota –e aproveitando os restos que o incêndio não terminou de consumir- se deve começar a levantar um novo edifício, sem medo a que, uma vez mais, o fogo do capital devore nossa obra. Esse “segundo assalto proletario” e –mais concretamente- seu desenvolvimento teórico e prático mais sólido, a Internacional Situacionista, é o objeto de estudo deste ensaio. Sua finalidade é aprender do passado para construir o futuro. Vagando de derrota em derrota até a vitória final.
O movimento obreiro clássico foi definitivamente derrotado durante a primeira metade do século XX. Depois do fracasso da Revolução Espanhola, a catástrofe que supôs a Segunda Guerra Mundial e a divisão do mundo de pós-guerra em dois blocos antagónicos –anverso e reverso de uma mesma moeda: a ditadura da industrialização, da economia independente do ser humano- se fez evidente que as tentativas de criação de uma sociedade não baseada na mercadoria não tinham podido superar suas limitações próprias e as impostas pelo inimigo a bater. O movimento obreiro ficou desarmado ideológicamente, dividido e atrapado na crescente hostilidade entre o bloco capitalista ocidental e a burocracia soviética. A isso se unia o desenvolvimento de um novo modelo de capitalismo, no que proletariado ia ser integrado no sistema mediante sua transformação em “consumidor”[2], passando de ser agente histórico da revolução a um elo mais da corrente. O “Estado do bem-estar” nascia ao mesmo tempo que morria o conceito clássico de luta de classes. Um mundo novo tinha nascido, mas não era a tão ansiada utopia emancipadora, senão mais bem a distopía que presagiaram George Orwell e Aldous Huxley.
A começos do século XX, ao mesmo tempo que o movimento obreiro desenvolvia sua luta histórica pela emancipação política e econômica, na arte se estava desenvolvendo outra revolução que lutava por sua libertação do caráter de mercadoria de consumo da burguesia. As vanguardas artísticas do primeiro terço do século XX trataram de superar os marcos tradicionais da atividade artística e de integrar a arte na prática cotidiana[3], mas viram como suas tentativas fracassavam afogadas pela situação bélica em Europa, pela impossibilidade de superar a cosificación da arte sem previamente superar a cosificación da própria humanidade e por sua clara incapacidade para conectar com os interesses da classe obreira.
A Segunda Guerra Mundial e o Holocausto –constatação da barbárie na que está imerso o mundo- supuseram um ponto de inflexão que custou muito superar. Não será até finais dos anos cinquenta do século XX quando comecem a apreciar-se signos de uma lenta recuperação da crítica radical –tanto no âmbito político como no artístico-, que não terminarão de cristalizar até os anos sessenta, com a explosão do telefonema “nova esquerda”. Será nessa década dos sessenta quando se produza uma renovação teórica e prática da esquerda que trata de adaptar-se às novas condições que impõe o capitalismo posindustrial.
Neste marco histórico é no que há que inscrever à Internacional Situacionista, um movimento vanguardista no que o político e o artístico se fusionam para tratar de superar as condições de separação da vida às que nos submete a sociedade capitalista avançada. A história da Internacional Situacionista e de sua principal figura –Guy Debord- é a história da luta política dos últimos cinquenta anos; com suas vitórias e suas derrotas, suas grandezas e suas misérias, seus acertos e seus erros. Levar a cabo uma análise em profundidade do que supôs a Internacional Situacionista é avançar em pos da construção de um movimento crítico que nos permita conquistar um futuro que nos pertence menos a cada instante.
Os antecedentes: as vanguardas artísticas dos anos cinquenta.
“Com o próprio conceito de arte está misturada o fermento que o supera.”
Theodor W. Enfeite[4]
Depois do impasse que supôs a Segunda Guerra Mundial e o imediato pós-guerra na que Europa tratava lentamente de recuperar-se do desastre, os anos cinquenta vêem desenvolver-se no velho continente –especialmente em França- uma verdadeira recuperação dos movimentos de vanguarda, que devem enfrentar-se a dois problemas fundamentais: por um lado, superar a influência de Breton e do surrealismo, e, por outro, tratar de adaptar sua mensagem e sua prática a uma sociedade mutante que se parece muito pouco à da Europa de preguerra. Assim, ao longo da década surgem ou se consolidam diferentes movimentos que –seguindo a senda marcada pelas vanguardas clássicas de começos do século XX- procuram a fusão da arte e a vida cotidiana. Estes movimentos artísticos constituem a semente da que nascerá a Internacional Situacionista que superará a barreira do artístico para constituir-se em movimento político. Para compreender sua história é preciso conhecer seus antecedentes.
O grupo COBRA -do que fizeram parte Asger Jorn e Constant, dois dos fundadores da Internacional Situacionista- pode considerar-se a primeira vanguarda de pós-guerra[5]. Surgiu em 1948 como uma reação à paralisia em que tinha entrado o surrealismo, movimento ao que criticam duramente por seu afastamento da realidade. O grupo COBRA adianta alguns aspectos que se irão concretando nos movimentos vanguardistas posteriores, tendo especial relevância na Internacional Situacionista. Em primeiro lugar, a marcante influência do filósofo Henry Lefebvre e suas teses sobre a vida cotidiana, que abrem um campo novo à investigação social e mostram a realidade de uma sociedade que avança para um novo modelo, a chamada “sociedade do bem-estar”, na que uno dos aspectos fundamentais das reclamações dos movimentos vanguardistas será a da satisfação dos “desejos” [6]. Esta busca da satisfação dos desejos terá um grande desenvolvimento no pensamento situacionista, sendo uma de suas contribuições principais, ao mesmo tempo que um de seus maiores problemas, já que, em não poucos casos, essa importância concedida à satisfação do desejo, ao prazer em soma, degenerará em puro hedonismo, como veremos mais adiante. O outro conceito finque do grupo COBRA que passará à Internacional Situacionista é o de “urbanismo unitário”, criado por Constant como uma alternativa ao modelo de arquitetura de Lhe Corbusier e que ele mesmo levará à Internacional Situacionista[7]. Frente às “máquinas de habitar” e a industrialização do urbano propostas por Lhe Corbusier, Constant vislumbrava uma cidade humana na que o imaginativo e o funcional se conjugassem.
Apesar do afastamento que COBRA tinha marcado com respeito a Breton e o surrealismo, a ruptura definitiva das vanguardas de pós-guerra com o surrealismo ia chegar com o Movimento Letrista de Isidore Isou, um exilado romeno em França interessado fundamentalmente nas letras como unidades básicas sobre as que construir sua obra. Isou e seus colaboradores –entre os que se encontra um jovem Debord que se une ao movimento com só 20 anos- desenvolverão uma poesia, uma pintura e um cinema letrista. Este último, de corte netamente experimental –se tomavam cortes de outras películas e imagens sem sentido algum e se as manipulava rayándolas ou escrevendo sobre elas letras e números- terá grande influência nos situacionistas. No Movimento Letrista se encontra outra das claves da Internacional Situacionista e da nova esquerda em general: o caráter juvenil, de revolta de geração[8]. A direção da revolução já não está em mãos dos obreiros nem dos velhos líderes políticos e sindicais, senão na dos estudantes e a nova geração de intelectuais.
Em 1952 se produziu uma cisão no Movimento Letrista que deu origem à Internacional Letrista[9], formada pelo asa esquerda do movimento e na que teve um especial protagonismo o casal Debord-Bernstein. A Internacional Letrista publica uma revista, Potlach, na que se esboçam algumas das idéias fundamentais que depois passarão à Internacional Situacionista: o urbanismo unitário, a construção de situações ou a prática do desvio. As bases da I.S. encontram-se já no Letrismo, ao mesmo tempo que se afiança o papel de Debord como figura principal do movimento. Ao mesmo tempo que nascia o Letrismo, das cinzas de COBRA tinha surgido um novo ismo, o Movimento Internacional por uma Bauhaus Imaginativa (IMIB), que tinha entre seus membros a Asger Jorn e Enrico Baj. O IMIB se orientava basicamente para a pintura e rapidamente começou a organizar exposições e reuniões com outros movimentos artísticos, entre os que se encontrava a Internacional Letrista. Fruto desses contatos entre ambos grupos nascerá a Internacional Situacionista.
A Internacional Situacionista e o “Segundo assalto proletario à sociedade de classes”.
“Que se nos deixe de admirar como se fôssemos superiores a nossa época; e que a época se aterrorize admirando-se pelo que é.”
Guy Debord e Gianfranco Sanguinetti[10]
O 28 de julho de 1957 em Cosio d’Arroscia, uma pequena cidade italiana, tem lugar a fusão da Internacional Letrista e o IMIB, criando-se a Internacional Situacionista[11]. A maior parte dos situacionistas eram franceses, pelo que sua sede se estabelece em Paris, ainda que desde um primeiro momento teve uma vocação internacionalista. A I.S. foi somando apoiantes, criando-se em seguida as seções italiana, belga e alemã, à que seguirá depois a inglesa, conquanto o número total de situacionista nunca chegou a superar o de umas poucas dezenas. No verão de 1958 se publica o primeiro número de Internationale Situationniste, órgão de expressão da I.S. As primeiras iniciativas dos situacionistas tiveram um caráter principalmente artístico, como as exposições de pintura “industrial” de G. P. Gallizio.
Desde um primeiro momento, Guy E. Debord impôs sua forte personalidade na I.S., convertendo-se num novo Breton que controlou com mão de ferro a I.S. e lhe deu um caráter personalista e de vanguarda intelectual[12]. Neste sentido caberia falar das similitudes existentes entre o surrealismo e a Internacional Situacionista. César De Vicente assinala três características comuns a ambos movimentos: a criação de um novo campo intelectual sobre o que se desenvolve uma teoria e uma praxe; a existência de uma “figura central”, Breton/Debord; e o fato de que o nome do movimento vinga dado por seus próprios integrantes, que são os que estabelecem um significado e um uso concreto do nome[13]. Além dessas possíveis analogias, o verdadeiro é que tanto o surrealismo como a I.S. estiveram muito unidos ao desenvolvimento pessoal de seus principais impulsores Breton/Debord, ambos de grande capacidade intelectual, mas também dotados de uma verdadeira intransigência e um caráter messiânico, o que com freqüência dificultou as próprias atividades dos grupos que dirigiram.
Este caráter personalista que Debord impõe na I.S. provocou que desde seus começos surgissem problemas com outros membros e qualquer desvio ou crítica aos postulados que Debord e seus mais fiéis seguidores impunham era saldada com a expulsão imediata. As principais disensiones no seio da I.S. tinham como base as diferenças entre os que primavam o conteúdo político (Debord) e os que davam maior importância ao artístico (Constant)[14]. A seção alemã da I.S., organizada em torno da revista Spur, tinha um caráter mais artístico e menos político do que as seções francesa e belga. Desde 1960 teve vários choques entre as seções que se concretaram em 1962 na expulsão do grupo Spur que se constituiu na autodenominada 2ª Internacional Situacionista, com Nash como figura marcante, e que se desenvolverá à margem dos postulados da I.S. que, a partir de então, tomará um cariz bem mais político. Esta cisão foi a mais importante que se deu na I.S., dividindo-a em mais duas partes ou menos iguais, ainda que não seria a última e nos dez anos de vida que lhe ficavam à I.S. as expulsões e demissões –voluntárias ou forçadas- foram contínuas.
Apesar de realizar uma intensa atividade artística e de publicar vários números de sua revista Internationale Situationniste, a I.S. era escassamente conhecida além de um reduzido círculo de intelectuais e artistas. Não será até 1966, ao fazer-se um grupo de estudantes próximos às teses situacionistas com o controle da seção da União Nacional de Estudantes de França (UNEF) de Estrasburgo, quando os situacionistas se dêem a conhecer à sociedade francesa. O chamado “escândalo de Estrasburgo” se produziu ao publicar-se um texto de Mustapha Khayati, Sobre a miséria da vida estudiantil considerada sob seus aspectos econômico, político, psicológico, sexual e intelectual[15], com fundos do sindicato. O texto provocou uma grande polêmica e motivou a intervenção judicial, o que foi utilizado pela I.S. para dar-se a conhecer e conseguir sair do ghetto político e artístico[16]. O manifesto, que foi revisado e aprovado pela cúpula da I.S., estava redigido numa linguagem crua e direta que procurava a provocação -o que indubitavelmente conseguiram- para publicitarse e atrair aos elementos mais radicais do movimento estudiantil.
O período que medeia entre a publicação do texto de Khayati e as revoltas de maio do 68 será o de maior relevância pública da I.S., conquanto nunca chegou a superar seu caráter de vanguarda, com uma implantação limitada no movimento estudiantil e praticamente nula entre os obreiros. Apesar da importância que os situacionistas se deram a si mesmos nas revoltas parisinas de maio do 6868[17], seu papel não foi tão relevante como lhes tivesse agradado que fosse, conquanto algumas de suas idéias e consignas coalharam numa parte do movimento estudiantil e na Sorbona se puderam ver inumeráveis pintadas com lemas situacionistas. O denominado “segundo assalto proletario à sociedade de classes” encontrou, em opinião de Ken Knabb sua “expressão teórica mais avançada na Internacional Situacionista”[18], mas não passou da teoria à prática, fracassando precisamente onde mais inovadora tinha sido a Internacional Situacionista, em sua “crítica unitária da sociedade”[19]. A base política dessa ”crítica unitária” deviam ser os conselhos obreiros, entendidos como um tipo de organização social que devia conjugar -numa crítica unitária- o individual e o coletivo com o fim de superar o “conjunto de alienações” a que nos submete o capitalismo e realizar a “revolução da vida cotidiana” proposta pelos situacionistas[20]. Não se tratava de uma revolução econômica, política ou social, senão de uma revolução integral que conseguisse a “autogestión generalizada”, a libertação em todos os aspectos da vida.
Maio de 1968 teve duas características destacáveis: seu caráter global e a constatação do papel relevante que ainda mantinha o velho proletariado[21]. A globalização da revolta é um dos aspectos mais importantes de Maio do 68, ao anunciar uma realidade que se foi impondo ao longo dos últimos anos do século XX e os primeiros do XXI. Frente a um mundo cada dia mais uniformizado pelo capitalismo multinacional, a oposição ao sistema deve ter um caráter global, deve levar-se a cabo a escala mundial. França foi a vanguarda, mas a revolta também estourou em Inglaterra, em Estados Unidos, em Alemanha e até na Europa do Leste. Maio do 68 também mostrou à “nova esquerda” dos intelectuais e os estudantes que não podiam chegar a nenhum lugar sem contar com o “velho” proletariado. Não foi até que as fábricas se pararam e os obreiros saíram à rua junto aos estudantes quando a revolta se converteu num verdadeiro perigo para o Estado francês. Apesar da decadência do movimento obreiro e da paralisia e conservadorismo dos partidos e sindicatos de esquerda era evidente que nenhuma revolução podia levar-se a cabo sem contar com (o que ficava de) a classe obreira, outra questão é a de se essa classe obreira queria sua libertação.
É indubitável que a revolta parisina de maio de 1968 fracassou estrondosamente. Os obreiros regressaram às fábricas, os estudantes à comodidade da casa paterna e a “maioria silenciosa” lhe voltou a dar a maioria nas eleições ao general De Gaulle. Não teve uma repressão tão brutal como a da Comuna de 1871, não se produziu também não a diáspora de revolucionários.
Simplesmente se voltou mansamente à (não)vida de sempre. O capitalismo tinha ganhado uma nova batalha e saía –uma vez mais- reforçado da confrontação. O movimento revolucionário ficou desarticulado e muitos de seus protagonistas se reciclaram e passaram a fazer parte da “esquerda do sistema”.
A I.S. não soube enfrentar sua derrota e foi perdendo membros e idéias a um ritmo crescente a partir de então. Em 1972 se dissolvia com a publicação de um texto, co-assinado por Debord e Gianfranco Sanguinetti[22], no que faziam balanço da obra dos situacionistas e declaravam aberta uma nova época na que as idéias situacionistas se estenderiam e dariam lugar a uma forte corrente revolucionária que mudaria o mundo. O mesianismo de Debord fazia de novo ato de presença, pois era evidente que a situação a começos dos anos setenta era tudo menos revolucionária. A Internacional Situacionista fracassou em suas expectativas de implantação a uma escala ampla de suas teorias, mas a força de sua crítica ao capitalismo espetacular –ou posindustrial ou como queiramos chamar-lhe- lhe reservou um lugar de honra no imenso panteão das revoluções fracassadas.
Alguns aspectos teóricos da Internacional Situacionista: Urbanismo, crítica da arte e vida plena.
“Na linguagem da contradição a crítica da cultura se apresenta unificada: quanto que domina o tudo da cultura –seu conhecimento como sua poesia- e quanto que já não se separa mais da crítica da totalidade social. É esta crítica teórica unificada a única que vai ao encontro da prática social unificada.”
Guy Debord[23]
O conceito principal em torno do qual gira toda a teoria situacionista é o de “vida”, enquanto esta ficou reduzida a uma mera representação e é necessária uma teoria e uma prática que permitam superar essa separação até chegar a sua plena realização livre dos condicionantes que lhe impõe o capitalismo em sua fase espetacular: “Toda a vida das sociedades nas que dominam as condições modernas da produção se apresentam como uma acumulação de espetáculos. Tudo o que era vivido diretamente se aparta numa representação.”[24] Os situacionistas propõem uma rejeição radical às condições de vida que impõe o capitalismo, procuram a realização de uma vida plena e unificada, pelo que sua crítica também será unificada, o que se recusa é a totalidade do sistema capitalista, não um aspecto determinado.
Depois de ter repassado brevemente a história da I.S. é necessário deter-se em algumas das idéias mais importantes dos situacionistas. Aqui se analisarão algumas dessas idéias, mas sem esquecer em nenhum momento que os diferentes aspectos da crítica situacionista não se podem separar uns de outros senão que todos se englobam numa crítica unitária do capitalismo. Três serão os conceitos a tratar: o urbanismo, a crítica da arte e seu conceito de vida.
A I.S. concedeu especial importância à cidade como marco de referência da luta histórica do proletariado por sua emancipação. Desde um primeiro momento as questões relativas ao urbanismo tiveram grande importância nas teses situacionistas, desenvolvendo-se em torno de dois conceitos finque: o urbanismo unitário e a psicogeografía. O urbanismo unitário consistia numa crítica global do urbanismo espetacular, enquanto espaço alienado à vida cotidiana ao ser-lhe imposta uma especialização –forjada sobre a existente divisão do trabalho- e um extrañamiento do meio. A crítica situacionista ao urbanismo procurava uma cidade social e lúdica na que o jogo, a imaginação e a participação social em sua construção fossem um fato[25]. A intervenção prática na cidade por parte dos situacionistas se concretava na psicogeografía e a prática da deriva[26]. Esta prática combinava o aleatório, o “deixar-se levar” através da paisagem urbana, com o estudo de planos e mapas, tudo isso conectando-o com umas supostas variáveis psicogeográficas que influiriam na deriva de modos diferentes segundo as pessoas e as próprias condições do meio urbano. Nas teorias situacionistas sobre a cidade se aprecia de forma clara o grande problema ao que se enfrentou a I.S. Pretendia unificar a crítica teórica da sociedade capitalista e a prática que superasse essa realidade, mas o verdadeiro é que, frente a sua análise acertada e lúcida do urbanismo totalitário, as propostas práticas não passaram em muitos casos de esboços e idéias vadias.
Os situacionistas consideravam que a arte era uma parte mais da sociedade espetacular que tinha do que superar enquanto era um aspecto mais da separação a do que estamos submetidos[27]. Debord, escreveu na sociedade do espetáculo: “O dadaísmo quis suprimir a arte sem realizá-lo; e o surrealismo quis realizar a arte sem suprimí-lo. A posição crítica elaborada depois pelos situacionistas mostrou que a supressão e a realização da arte são os aspectos inseparáveis de uma mesma superação da arte”[28]. Tratava-se de superar a arte como esfera separada da vida, como especialização. A crítica da arte dos situacionistas parte –necessariamente- de uma crítica da divisão do trabalho que compartimenta a vida em esferas e define às pessoas em relação a sua função social, empobreciendo nossas vidas. O corpo central da crítica situacionista da arte pode rastrear-se em pensadores utópicos do século XIX como William Morris[29] e nas vanguardas históricas do primeiro terço do século XX, mas esta concepção da prática artística encontrou sua expressão mais radical nas teorias situacionistas, ao mesmo tempo que tratava de superar as contradições nas que tinham incorrido os dadaístas e os surrealistas[30]. Até que ponto conseguiram os situacionistas superar essa divisão é algo discutível, mas o que é verdadeiro é que encontraram resquícios através dos quais minar a “cultura séria” e superar a separação entre produtor-consumidor de arte. Os meios preferidos para isso foram os happenings e performances e o desvio –plagio- de quadros, fotografias, cartazes publicitários ou histórias em quadrinhos[31].
O situacionismo não conseguiu superar a arte, mas sim conseguiu baixá-lo do pedestal e dar-lhe novas perspectivas críticas, desde então um spray e um cartaz publicitário podem converter-se em instrumentos suficientes para desenvolver um ataque “artístico” contra o sistema. Mas também é verdadeiro que muitas das idéias situacionistas sobre a arte foram recicladas pelo sistema e utilizadas em seu favor. Hoje é habitual ver músicos, anúncios publicitários ou galerias de arte que utilizam -conscientemente ou inconscientemente- recursos desenvolvidos pelos situacionistas como o desvio para vender-nos o último produto de moda. A capacidade do capitalismo para dar a volta às críticas e adaptá-las a suas propostas, descontextualizándolas e eliminando qualquer mensagem crítica é algo que não pode deixar de surpreender a qualquer que tenha estudado um pouco a história dos movimentos anticapitalistas.
Como já se repetiu ao longo deste ensaio, um dos aspectos fundamentais da crítica situacionista é o relativo à crítica da vida segundo as condições que impõe a “sociedade espetacular”. O objetivo dessa crítica procuraria uma realização plena da vida, numas novas condições afastadas do consumismo, a especialização e a separação, o que permitiria a satisfação de nossos desejos[32]. Assim, pode-se falar de um hedonismo situacionista que parte das teorias de Lefevbre sobre a vida cotidiana e do Homo ludens de Huizinga. O jogo terá grande importância nas teorias situacionistas, chegando-se a falar em alguns textos da “revolução como jogo”[33]. Essa busca de uma realização plena da vida há que a ver como uma rejeição total às condições de existência do capitalismo. Rejeição ao tempo de lazer como uma parte mais da separação da vida, como a outra cara –amável- da divisão do trabalho, mas igual de alienante que o resto de condições que nos impõe o capitalismo. Rejeição de um sistema que reduz aos seres humanos a “recursos humanos” intercambiables. Rejeição da “catástrofe cotidiana”[34], em soma, que é ao que reduz a vida a sociedade capitalista.
A reivindicação de uma vida plena frente à (não)vida que impõe a Sociedade do Espetáculo é quiçá a contribuição mais valiosa dos situacionistas à crítica social, mas também pode tornar-se num arma de duplo fio. Como já pusesse de manifesto Ken Knabb, o ludismo situacionista e sua postura “antisacrificio” podem servir como álibi para não render contas e para mudar de jaqueta em qualquer momento[35]. Essa busca da satisfação do desejo, que tem um conteúdo netamente revolucionário nas teses situacionistas, também pode transformar-se em seu contrário, quando se converte na única meta, podendo-se falar de “situacionista egoísta”, aquele que adota uma postura pueril na que o único que importa é a satisfação dos próprios desejos sem ter em conta a situação global da sociedade e descartando a crítica radical da mesma[36].
Esse caráter lúdico passará à maioria de movimentos sociais posteriores, mas totalmente descontextualizado, não é parte de uma crítica coerente senão uma reivindicação por si mesma, o que levará ao paradoxo de que o que era uma crítica à sociedade do espetáculo se transforme numa parte do mesmo espetáculo que se desejava abolir, como sucede com a maioria dos movimentos antiglobalização deste começo do século XXI. Os novos movimentos sociais se caracterizam por seu “simulacro de protesto”, no que prima mais o simbólico do que a ação real. O “buenrollismo político” e o caráter lúdico dos protestos transformam a luta em algo light, num jogo no que a responsabilidade e o compromisso são mínimos, seguindo o lema: “aventura sim, mas sem riscos”[37]. É necessário superar esse dogma sacado de contexto –não se pode entender a reivindicação situacionista da satisfação dos desejos sem inserí-la em sua crítica unitária da sociedade capitalista- para avançar na busca de um mundo novo[38]. A revolução não é um jogo, é algo muito sério.
O legado situacionista: entre a revolução e a assimilação.
“Anúncios publicitáriosque prometem felicidadede algum produto de modaque te fará mudar.Comprador entra na loja,ao espreito o vendedor.Vendedor que vende produto,comprador que vá mamar.
¡Oh, sim, sim! ¡Vos enganam, enganam-vos assim!¡Oh, sim, s!, ¡Vos enganam, enganam-vos as!.”
Eskorbuto[39]
Apesar do fracasso do projeto histórico de superação da sociedade capitalista proposto pela Internacional Situacionista, seu legado pervivió e hoje é mais do que evidente sua influência em numerosos movimentos sociais, políticos e artísticos. A análise do capitalismo posindustrial levado a cabo pelos situacionistas se mostrou extremamente lúcido e acertado em muitos de seus pontos e, apesar de não ter sabido concretar seu “crítica teórica unificada” numa “prática social unificada”, as idéias situacionistas seguiram animando o debate político antagonista até os começos deste século XXI, mostrando como muitas de suas idéias se adiantaram a seu tempo.
Um dos movimentos nos que mais facilmente se pode rastrear a influência situacionista é no punk. Conquanto está influência com freqüência pôde ser magnificada[40], é evidente que as teorias situacionistas, bem por via direta ou –mais freqüentemente- indirecta, influíram em grande parte no punk. No desenvolvimento do punk na Inglaterra dos anos setenta tiveram grande importância dois personagens que conheciam as idéias situacionistas e que contribuíram a sua introdução no movimento, conquanto a maioria de jovens punks não tinham a menor idéia de quem era Guy Debord. Tanto Jaime Reid, desenhista das portadas de Sex Pistols como Malcolm McLaren, sua manager, tinham entrado em contato com os situacionistas e através deles se introduziram as teorias situacionistas no punk[41], o que foi posteriormente ampliado por grupos que sim tiveram um contato mais direto com as idéias situacionistas e com outros movimentos artísticos e políticos, como os anarcopunks Crass. Questões como a superação do papel músico/espectador, a rejeição da indústria cultural por meio da cultura do “Do It Yourself” (D.I.E.) ou a imediatez –queremos a revolução e a queremos agora- têm evidentes pontos de conexão com as teorias situacionistas, bem como com outros movimentos vanguardistas do século XX, desde Dadá ao Neoísmo, passando por fluxus ou o mail art.
Esta influência situacionista foi rapidamente desvirtuada pelas ânsias de dinheiro fácil e fama de grupos como Sex Pistols e oportunistas como McLaren. A denúncia do Espetáculo foi substituída pela assimilação ao mesmo. Era mais importante sair na televisão provocando, de maneira simplista, às anciãs com uma estética e uma atitude violenta e nihilista que denunciar as contradições do sistema e procurar a raiz dos problemas e as faltas de expectativas sociais para construir uma realidade diferente. A isso se uniu a chegada do neoliberalismo da mão de Reagan e Tatcher que desembocou na década dos oitenta num ambiente de desesperanza generalizado, era o Não Future em estado puro. Mesmo assim, pode-se rastrear uma herança situacionista –mais fiel a seus princípios- no punk e seus derivados até a atualidade.
Para concluir, é necessário dizer que as idéias situacionistas têm uma vigência e uma atualidade inegáveis –por desgraça- no momento atual de desenvolvimento do capitalismo, conquanto, algumas de suas teses se mostraram errôneas e alguns aspectos da evolução do capitalismo não receberam o atendimento necessário por parte dos situacionistas. A violência técnica à que estamos submetidos é hoje o principal problema ao que nos enfrentamos, já que reduz as possibilidades da crítica, ao vender-nos que vivemos no melhor dos mundos possíveis e do que só tenderá a melhorar se nos deixamos levar da mão da tecnificación e a artificialización, mas a realidade é que isto só conduz à sinrazón, a uma pseudovida que não é mas que um sucedâneo adulterado do que significa a vida humana[42]. É o fim da história. O Espetáculo se apresenta como inevitável e qualquer oposição se recusa como estéril, como uma postura romântica mas inútil. Hoje somos mais escravos que nunca, já que a possibilidade de mudar nosso modo de vida e as condições sociais da mesma se apresentam mais longínquos do que em nenhum outro momento da história.
O grande erro da I.S. foi o de não ter sabido dar o passo definitivo para uma prática que supusesse uma alternativa real ao sistema capitalista, aproveitando as contradições do próprio sistema. Essa tarefa inacabada pode considerar-se o fracasso das teorias situacionistas, mas também pode ser o germe a partir do qual possa surgir um novo fermento emancipatorio que supere a teoria situacionista ali onde esta fracassou, isto é, realizando-a. O triunfo das teses situacionistas passará por sua superação como meio de supressão do Espetáculo. Para isso existe a história, para aprender dela e por isso os apologistas do capital anunciam felizes seu fim. O fim da história será o fim da possibilidade de emancipação da humanidade. Não o permitamos.
Recuperemos a história e façamos história. ¡¡Recuperemos nossas vidas!!
NOTAS:
. [1] André Gide: O inmoralista, Argos Vergara, Barcelona, 1981, p. 13
. [2] Miguel Amorós: “Tecnologia e dissolução de classes”, As armas da crítica, Likiniano elkartea, Bilbao, 2004, p.40
. [3] Stewart Home: O assalto à cultura. Correntes utópicas desde o Letrismo a Class War, Vírus, Barcelona, 2002, p. 17
. [4] Theodor W. Enfeite: Teoria estética, Akal, Madri, 2004, p. 13
. [5] É certo nada mais terminar a Segunda Guerra Mundial tinham começado a surgir novos movimentos artísticos, aos que teria que adicionar os movimentos clássicos que sobreviveram à guerra como o surrealismo –conquanto muito dividido e debilitado-, mas se pode afirmar sem temor a errar que o grupo COBRA foi a primeira grande vanguarda do pós-guerra.
. [6] Stewart Home: op.cit., p. 46
. [7] Um esboço destas idéias se pode encontrar em: N. Constant: “Outra cidade para outra vida”, Internacional Situacionista. Textos completos em castelhano da revista Internationale Situationniste (1958-1969), vol.1. A realização da arte, Literatura cinza, Madri, 2001, pp. 106-109
. [8] Esta poderia ser uma das razões que explicam o fracasso das vanguardas da segunda metade do século XX e o porquê de que muitos de seus integrantes tenham acabado abraçando posturas conservadoras em sua maturidade. A rebeldia é aceitada para a juventude e considerada loucura na maturidade.
. [9] O motivo da ruptura foi a irrupção de um grupo de letristas numa conferência de imprensa de Charles Chaplin, o que provocou a condenação pública de Isou, ao que os dissidentes responderam com um comunicado no que se constituía o novo grupo. Stewart Home: op. cit., p. 57
. [10] Guy Debord e Gianfranco Sanguinetti: “Tese sobre a Internacional Situacionista e seu tempo”, apêndice a Internacional Situacionista. Textos completos em castelhano da revista Internationale Situationniste (1958-1969),vol.3. A prática da teoria, Literatura cinza, Madri, 2001 # , 60, p. 682
. [11] O nome remete à prática da “construção de situações”, entendendo que uma situação construída é um “momento da vida construído concreta e deliberadamente para a organização coletiva de um ambiente unitário e de um jogo de acontecimentos”, em: “Definições”, Internacional Situacionista. Textos completos em castelhano da revista Internationale Situationniste (1958-1969), vol.1. A realização da arte, p.14
. [12] Stewart Home: op. cit., pp. 77-8
. [13] César De Vicente: “Introdução” a Discurso sobre a vida possível. Textos situacionistas sobre a vida cotidiana, Hiru, Hondarribia, 1999, pp. 8-9
. [14] Ibídem, p. 14
. [15] O texto íntegro em castelhano se pode encontrar no Arquivo Situacionista Hispano em internet: http://sindominio.net/ash/miséria.htm
. [16] “Nossos fins e nossos métodos no escândalo de Estrasburgo”, Internacional Situacionista. Textos completos em castelhano da revista Internationale Situationniste (1958-1969),vol.3. A prática da teoria, 486-93
. [17] René Viénet: Enragés e situacionistas no movimento das ocupações, http://sindominio.net/ash/enrages.htm
. [18] Ken Knabb: “A sociedade do situacionismo”, Segredos a vozes, Literatura cinza, Madri, 2001, p. 46
. [19] Guy Debord: A sociedade do espetáculo, Maldeojo, s.f., #121, p.52 Utilizo a versão pirata de Maldeojo frente à “legal” de Pré-Textos. Para uma discussão sobre a tradução veja-se: “Tradução defeituosa da sociedade do espetáculo”, http://sindominio.net/ash/esptrad.htm
. [20] Raoul Vaneigem: “Aviso aos civilizados com respeito à autogestión generalizada”, Internacional Situacionista. Textos completos em castelhano da revista Internationale Situationniste (1958-1969),vol.3. A prática da teoria, pp. 600-6
. [21] Ken Knabb: op. cit., p. 52
. [22] Guy Debord e Gianfranco Sanguinetti: “Tese sobre a Internacional Situacionista e seu tempo”, apêndice a Internacional Situacionista. Textos completos em castelhano da revista Internationale Situationniste (1958-1969),vol.3. A prática da teoria, pp. 655-85
. [23] Guy Debord: A sociedade do espetáculo, # 211, p. 85
. [24] Ibídem, #1, p.3
. [25] N. Constant: “Outra cidade para outra vida”, em Internacional Situacionista. Textos completos em castelhano da revista Internationale Situationniste (1958-1969), vol.1. A realização da arte, pp. 106-109; Attila Kotányi e Raoul Vaneigem: “Programa elementar do escritório de urbanismo unitário”, em Internacional Situacionista. Textos completos em castelhano da revista Internationale Situationniste (1958-1969), vol.1. A realização da arte, pp. 211-13
. [26] No primeiro número da revista Internationale Situationniste se dão as seguintes definições de “psicogeografía” e de deriva. Psicogeografía: “Estudo dos efeitos precisos do meio geográfico, ordenado conscientemente ou não, ao atuar diretamente sobre o comportamento afetivo dos indivíduos.” Deriva: “Modo de comportamento experimental unido às condições da sociedade urbana; técnica de passagem ininterrupto através de ambientes diversos. Usa-se também mais especificamente para designar a duração de um exercício contínuo desta experiência.” em Internacional Situacionista. Textos completos em castelhano da revista Internationale Situationniste (1958-1969), vol.1. A realização da arte, p. 15
. [27] Seção inglesa da Internacional Situacionista: A revolução da arte moderna e a arte moderna da revolução, Pepitas de abóbora, Logronho, 2004
. [28] Guy Debord: A sociedade do espetáculo, #192, p. 78
. [29] William Morris: “A arte sob a plutocracia”, Como vivemos e como poderíamos viver. trabalho útil ou esforço inútil. A arte sob a plutocracia, Pepitas de abóbora, Logronho, 2004
. [30] Segundo Theodor W. Enfeite, na prática das vanguardas clássicas se produziria um paradoxo, ao chocar a liberdade criativa que propugnavam com a perda de liberdade “no tudo”, isto é, no resto de âmbitos da vida, produzindo-se uma maior separação de arte e vida, Theodor W. Enfeite: op.cit., pp.9-10
. [31] René Vienet: “Os situacionistas e as novas formas de ação na política e a arte”, Internacional Situacionista. Textos completos em castelhano da revista Internationale Situationniste (1958-1969), vol.3. A prática da teoria, pp. 494-6
. [32] “A direção realmente experimental da atividade situacionista é o estabelecimento, a partir de desejos mais ou menos conhecidos, de um campo de atividade temporária favorável a estes desejos. Isso só pode trazer consigo o esclarecimento dos desejos primitivos e a aparição confusa de outros novos, cuja raiz material será precisamente a nova realidade constituída pelas construções situacionistas.”, nota editorial ao número 1 de Internationale Situationniste: “Problemas preliminares à construção de uma situação”, em Internacional Situacionista. Textos completos em castelhano da revista Internationale Situationniste (1958-1969), vol.1. A realização da arte, p.12
. [33] Seção inglesa da Internacional Situacionista: op. cit., p. 57 e ss.
. [34] Andrés Devesa: “Catástrofe espetacular e catástrofe cotidiana”, Re-Evolução, 1, 2005, pp. 9-11
. [35] Ken Knabb: “A realização e a supressão da religião”, op. cit., p. 70
. [36] Um caso paradigmático é o do ex-situacionista Raoul Vaneigem, máximo expoente desse hedonismo pueril e absurdo, Ibídem, p. 73
. [37] Miguel Amorós: “Quando o real se volta ilusório”, op. cit. pp. 9-14
. [38] “Para uma crítica efetiva da sociedade capitalista será necessário passar acima de um dos grandes dogmas do izquierdismo (pos)moderno, o hedonismo, que faz de todos nossos desejos imperativos categóricos que devem ser satisfeitos so pena de converter-nos em seres alienados por categorias passadas de moda como o ou o .”, Os Amigos de Ludd: “Se abre passo a crítica anti-industrial?”, Os Amigos de Ludd, 8, 2005, p. 3
. [39] “Vos enganam”, canção do disco Eskizofrenia de Eskorbuto.
. [40] Stewart Home: op. cit., p. 164
. [41] “Jaime Reid, em seu trabalho como desenhista, recuperou velhos cartazes situacionistas dando-lhes uma nova e livre versão. Assim, o pôster Atelier populaire de maio do 68 se convertia no God Save The Queen, onde a sagrada imagem da rainha de Inglaterra esburacava seus lábios com um grande imperdível”, Servando Rocha: “Punk e vanguarda contracultural. Mail art, situacionismo, futurismo e fluxus. O sabotagem à cultura séria”, A Felguera, 11, 2005
. [42] Para uma análise em profundidade do que significa e implica a artificialización e para uma crítica à industrialização forçada é conveniente conferir algum dos números do boletim de informação anti-industrial editado pelos Amigos de Ludd, especialmente interessantes para o tema aqui esboçado são os artigos: “Notas preliminares”, Os Amigos de Ludd, 1, 2001, pp. 1-5. e “Que fizestes de vossas vidas?”, Os Amigos de Ludd, 4, 2002, pp. 1-5 http://fcuatrocincouno.blogspot.com
Fahrenheit 451 Tuesday, Nov 15 2005, 6:54pm
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Auge e queda da crítica à sociedade espetacular
Uma análise crítica da história da Internacional Situacionista, seu desenvolvimento e propostas como movimento antagonista e sua decadência e assimilação por parte do sistema.Da luta de classes ao “Estado do Bem-estar”. O contexto histórico da Internacional Situacionista.
“Saber liberar-se não é nada; o árduo é saber ser livre…”
André Gide[1]
Faz já muito tempo que aquele fantasma que uma vez percorresse Europa dorme o sonho eterno nas frias catacumbas da História. Pouco fica da recordação da intensa agitação revolucionária que golpeou à velha Europa desde que o 28 de setembro de 1864 nascesse a primeira Internacional até maio de 1937 em que morreu a última esperança revolucionária nas ruas de Barcelona, sob as balas da contrarrevolución estalinista. Um conjunto de símbolos dispersos, uma memória distorcida e uma história frágil e freqüentemente manipulada é tudo o que conservamos desse “primeiro assalto proletario à sociedade de classes” que sucumbiu arrollado pelas rodas de aço do inevitável avanço do capitalismo. A esse “primeiro assalto” seguiu um “segundo assalto” que de novo fez tremer os alicerces do capitalismo. Mas o camaleón capitalista voltou a dar um giro de porca mais do que fez cair sobre a lona a seu adversário e nos atou ainda mais a nossa miséria. A história da luta contra o capital é a história uma derrota contínua. Mas sobre as cinzas dessa derrota –e aproveitando os restos que o incêndio não terminou de consumir- se deve começar a levantar um novo edifício, sem medo a que, uma vez mais, o fogo do capital devore nossa obra. Esse “segundo assalto proletario” e –mais concretamente- seu desenvolvimento teórico e prático mais sólido, a Internacional Situacionista, é o objeto de estudo deste ensaio. Sua finalidade é aprender do passado para construir o futuro. Vagando de derrota em derrota até a vitória final.
O movimento obreiro clássico foi definitivamente derrotado durante a primeira metade do século XX. Depois do fracasso da Revolução Espanhola, a catástrofe que supôs a Segunda Guerra Mundial e a divisão do mundo de pós-guerra em dois blocos antagónicos –anverso e reverso de uma mesma moeda: a ditadura da industrialização, da economia independente do ser humano- se fez evidente que as tentativas de criação de uma sociedade não baseada na mercadoria não tinham podido superar suas limitações próprias e as impostas pelo inimigo a bater. O movimento obreiro ficou desarmado ideológicamente, dividido e atrapado na crescente hostilidade entre o bloco capitalista ocidental e a burocracia soviética. A isso se unia o desenvolvimento de um novo modelo de capitalismo, no que proletariado ia ser integrado no sistema mediante sua transformação em “consumidor”[2], passando de ser agente histórico da revolução a um elo mais da corrente. O “Estado do bem-estar” nascia ao mesmo tempo que morria o conceito clássico de luta de classes. Um mundo novo tinha nascido, mas não era a tão ansiada utopia emancipadora, senão mais bem a distopía que presagiaram George Orwell e Aldous Huxley.
A começos do século XX, ao mesmo tempo que o movimento obreiro desenvolvia sua luta histórica pela emancipação política e econômica, na arte se estava desenvolvendo outra revolução que lutava por sua libertação do caráter de mercadoria de consumo da burguesia. As vanguardas artísticas do primeiro terço do século XX trataram de superar os marcos tradicionais da atividade artística e de integrar a arte na prática cotidiana[3], mas viram como suas tentativas fracassavam afogadas pela situação bélica em Europa, pela impossibilidade de superar a cosificación da arte sem previamente superar a cosificación da própria humanidade e por sua clara incapacidade para conectar com os interesses da classe obreira.
A Segunda Guerra Mundial e o Holocausto –constatação da barbárie na que está imerso o mundo- supuseram um ponto de inflexão que custou muito superar. Não será até finais dos anos cinquenta do século XX quando comecem a apreciar-se signos de uma lenta recuperação da crítica radical –tanto no âmbito político como no artístico-, que não terminarão de cristalizar até os anos sessenta, com a explosão do telefonema “nova esquerda”. Será nessa década dos sessenta quando se produza uma renovação teórica e prática da esquerda que trata de adaptar-se às novas condições que impõe o capitalismo posindustrial.
Neste marco histórico é no que há que inscrever à Internacional Situacionista, um movimento vanguardista no que o político e o artístico se fusionam para tratar de superar as condições de separação da vida às que nos submete a sociedade capitalista avançada. A história da Internacional Situacionista e de sua principal figura –Guy Debord- é a história da luta política dos últimos cinquenta anos; com suas vitórias e suas derrotas, suas grandezas e suas misérias, seus acertos e seus erros. Levar a cabo uma análise em profundidade do que supôs a Internacional Situacionista é avançar em pos da construção de um movimento crítico que nos permita conquistar um futuro que nos pertence menos a cada instante.
Os antecedentes: as vanguardas artísticas dos anos cinquenta.
“Com o próprio conceito de arte está misturada o fermento que o supera.”
Theodor W. Enfeite[4]
Depois do impasse que supôs a Segunda Guerra Mundial e o imediato pós-guerra na que Europa tratava lentamente de recuperar-se do desastre, os anos cinquenta vêem desenvolver-se no velho continente –especialmente em França- uma verdadeira recuperação dos movimentos de vanguarda, que devem enfrentar-se a dois problemas fundamentais: por um lado, superar a influência de Breton e do surrealismo, e, por outro, tratar de adaptar sua mensagem e sua prática a uma sociedade mutante que se parece muito pouco à da Europa de preguerra. Assim, ao longo da década surgem ou se consolidam diferentes movimentos que –seguindo a senda marcada pelas vanguardas clássicas de começos do século XX- procuram a fusão da arte e a vida cotidiana. Estes movimentos artísticos constituem a semente da que nascerá a Internacional Situacionista que superará a barreira do artístico para constituir-se em movimento político. Para compreender sua história é preciso conhecer seus antecedentes.
O grupo COBRA -do que fizeram parte Asger Jorn e Constant, dois dos fundadores da Internacional Situacionista- pode considerar-se a primeira vanguarda de pós-guerra[5]. Surgiu em 1948 como uma reação à paralisia em que tinha entrado o surrealismo, movimento ao que criticam duramente por seu afastamento da realidade. O grupo COBRA adianta alguns aspectos que se irão concretando nos movimentos vanguardistas posteriores, tendo especial relevância na Internacional Situacionista. Em primeiro lugar, a marcante influência do filósofo Henry Lefebvre e suas teses sobre a vida cotidiana, que abrem um campo novo à investigação social e mostram a realidade de uma sociedade que avança para um novo modelo, a chamada “sociedade do bem-estar”, na que uno dos aspectos fundamentais das reclamações dos movimentos vanguardistas será a da satisfação dos “desejos” [6]. Esta busca da satisfação dos desejos terá um grande desenvolvimento no pensamento situacionista, sendo uma de suas contribuições principais, ao mesmo tempo que um de seus maiores problemas, já que, em não poucos casos, essa importância concedida à satisfação do desejo, ao prazer em soma, degenerará em puro hedonismo, como veremos mais adiante. O outro conceito finque do grupo COBRA que passará à Internacional Situacionista é o de “urbanismo unitário”, criado por Constant como uma alternativa ao modelo de arquitetura de Lhe Corbusier e que ele mesmo levará à Internacional Situacionista[7]. Frente às “máquinas de habitar” e a industrialização do urbano propostas por Lhe Corbusier, Constant vislumbrava uma cidade humana na que o imaginativo e o funcional se conjugassem.
Apesar do afastamento que COBRA tinha marcado com respeito a Breton e o surrealismo, a ruptura definitiva das vanguardas de pós-guerra com o surrealismo ia chegar com o Movimento Letrista de Isidore Isou, um exilado romeno em França interessado fundamentalmente nas letras como unidades básicas sobre as que construir sua obra. Isou e seus colaboradores –entre os que se encontra um jovem Debord que se une ao movimento com só 20 anos- desenvolverão uma poesia, uma pintura e um cinema letrista. Este último, de corte netamente experimental –se tomavam cortes de outras películas e imagens sem sentido algum e se as manipulava rayándolas ou escrevendo sobre elas letras e números- terá grande influência nos situacionistas. No Movimento Letrista se encontra outra das claves da Internacional Situacionista e da nova esquerda em general: o caráter juvenil, de revolta de geração[8]. A direção da revolução já não está em mãos dos obreiros nem dos velhos líderes políticos e sindicais, senão na dos estudantes e a nova geração de intelectuais.
Em 1952 se produziu uma cisão no Movimento Letrista que deu origem à Internacional Letrista[9], formada pelo asa esquerda do movimento e na que teve um especial protagonismo o casal Debord-Bernstein. A Internacional Letrista publica uma revista, Potlach, na que se esboçam algumas das idéias fundamentais que depois passarão à Internacional Situacionista: o urbanismo unitário, a construção de situações ou a prática do desvio. As bases da I.S. encontram-se já no Letrismo, ao mesmo tempo que se afiança o papel de Debord como figura principal do movimento. Ao mesmo tempo que nascia o Letrismo, das cinzas de COBRA tinha surgido um novo ismo, o Movimento Internacional por uma Bauhaus Imaginativa (IMIB), que tinha entre seus membros a Asger Jorn e Enrico Baj. O IMIB se orientava basicamente para a pintura e rapidamente começou a organizar exposições e reuniões com outros movimentos artísticos, entre os que se encontrava a Internacional Letrista. Fruto desses contatos entre ambos grupos nascerá a Internacional Situacionista.
A Internacional Situacionista e o “Segundo assalto proletario à sociedade de classes”.
“Que se nos deixe de admirar como se fôssemos superiores a nossa época; e que a época se aterrorize admirando-se pelo que é.”
Guy Debord e Gianfranco Sanguinetti[10]
O 28 de julho de 1957 em Cosio d’Arroscia, uma pequena cidade italiana, tem lugar a fusão da Internacional Letrista e o IMIB, criando-se a Internacional Situacionista[11]. A maior parte dos situacionistas eram franceses, pelo que sua sede se estabelece em Paris, ainda que desde um primeiro momento teve uma vocação internacionalista. A I.S. foi somando apoiantes, criando-se em seguida as seções italiana, belga e alemã, à que seguirá depois a inglesa, conquanto o número total de situacionista nunca chegou a superar o de umas poucas dezenas. No verão de 1958 se publica o primeiro número de Internationale Situationniste, órgão de expressão da I.S. As primeiras iniciativas dos situacionistas tiveram um caráter principalmente artístico, como as exposições de pintura “industrial” de G. P. Gallizio.
Desde um primeiro momento, Guy E. Debord impôs sua forte personalidade na I.S., convertendo-se num novo Breton que controlou com mão de ferro a I.S. e lhe deu um caráter personalista e de vanguarda intelectual[12]. Neste sentido caberia falar das similitudes existentes entre o surrealismo e a Internacional Situacionista. César De Vicente assinala três características comuns a ambos movimentos: a criação de um novo campo intelectual sobre o que se desenvolve uma teoria e uma praxe; a existência de uma “figura central”, Breton/Debord; e o fato de que o nome do movimento vinga dado por seus próprios integrantes, que são os que estabelecem um significado e um uso concreto do nome[13]. Além dessas possíveis analogias, o verdadeiro é que tanto o surrealismo como a I.S. estiveram muito unidos ao desenvolvimento pessoal de seus principais impulsores Breton/Debord, ambos de grande capacidade intelectual, mas também dotados de uma verdadeira intransigência e um caráter messiânico, o que com freqüência dificultou as próprias atividades dos grupos que dirigiram.
Este caráter personalista que Debord impõe na I.S. provocou que desde seus começos surgissem problemas com outros membros e qualquer desvio ou crítica aos postulados que Debord e seus mais fiéis seguidores impunham era saldada com a expulsão imediata. As principais disensiones no seio da I.S. tinham como base as diferenças entre os que primavam o conteúdo político (Debord) e os que davam maior importância ao artístico (Constant)[14]. A seção alemã da I.S., organizada em torno da revista Spur, tinha um caráter mais artístico e menos político do que as seções francesa e belga. Desde 1960 teve vários choques entre as seções que se concretaram em 1962 na expulsão do grupo Spur que se constituiu na autodenominada 2ª Internacional Situacionista, com Nash como figura marcante, e que se desenvolverá à margem dos postulados da I.S. que, a partir de então, tomará um cariz bem mais político. Esta cisão foi a mais importante que se deu na I.S., dividindo-a em mais duas partes ou menos iguais, ainda que não seria a última e nos dez anos de vida que lhe ficavam à I.S. as expulsões e demissões –voluntárias ou forçadas- foram contínuas.
Apesar de realizar uma intensa atividade artística e de publicar vários números de sua revista Internationale Situationniste, a I.S. era escassamente conhecida além de um reduzido círculo de intelectuais e artistas. Não será até 1966, ao fazer-se um grupo de estudantes próximos às teses situacionistas com o controle da seção da União Nacional de Estudantes de França (UNEF) de Estrasburgo, quando os situacionistas se dêem a conhecer à sociedade francesa. O chamado “escândalo de Estrasburgo” se produziu ao publicar-se um texto de Mustapha Khayati, Sobre a miséria da vida estudiantil considerada sob seus aspectos econômico, político, psicológico, sexual e intelectual[15], com fundos do sindicato. O texto provocou uma grande polêmica e motivou a intervenção judicial, o que foi utilizado pela I.S. para dar-se a conhecer e conseguir sair do ghetto político e artístico[16]. O manifesto, que foi revisado e aprovado pela cúpula da I.S., estava redigido numa linguagem crua e direta que procurava a provocação -o que indubitavelmente conseguiram- para publicitarse e atrair aos elementos mais radicais do movimento estudiantil.
O período que medeia entre a publicação do texto de Khayati e as revoltas de maio do 68 será o de maior relevância pública da I.S., conquanto nunca chegou a superar seu caráter de vanguarda, com uma implantação limitada no movimento estudiantil e praticamente nula entre os obreiros. Apesar da importância que os situacionistas se deram a si mesmos nas revoltas parisinas de maio do 6868[17], seu papel não foi tão relevante como lhes tivesse agradado que fosse, conquanto algumas de suas idéias e consignas coalharam numa parte do movimento estudiantil e na Sorbona se puderam ver inumeráveis pintadas com lemas situacionistas. O denominado “segundo assalto proletario à sociedade de classes” encontrou, em opinião de Ken Knabb sua “expressão teórica mais avançada na Internacional Situacionista”[18], mas não passou da teoria à prática, fracassando precisamente onde mais inovadora tinha sido a Internacional Situacionista, em sua “crítica unitária da sociedade”[19]. A base política dessa ”crítica unitária” deviam ser os conselhos obreiros, entendidos como um tipo de organização social que devia conjugar -numa crítica unitária- o individual e o coletivo com o fim de superar o “conjunto de alienações” a que nos submete o capitalismo e realizar a “revolução da vida cotidiana” proposta pelos situacionistas[20]. Não se tratava de uma revolução econômica, política ou social, senão de uma revolução integral que conseguisse a “autogestión generalizada”, a libertação em todos os aspectos da vida.
Maio de 1968 teve duas características destacáveis: seu caráter global e a constatação do papel relevante que ainda mantinha o velho proletariado[21]. A globalização da revolta é um dos aspectos mais importantes de Maio do 68, ao anunciar uma realidade que se foi impondo ao longo dos últimos anos do século XX e os primeiros do XXI. Frente a um mundo cada dia mais uniformizado pelo capitalismo multinacional, a oposição ao sistema deve ter um caráter global, deve levar-se a cabo a escala mundial. França foi a vanguarda, mas a revolta também estourou em Inglaterra, em Estados Unidos, em Alemanha e até na Europa do Leste. Maio do 68 também mostrou à “nova esquerda” dos intelectuais e os estudantes que não podiam chegar a nenhum lugar sem contar com o “velho” proletariado. Não foi até que as fábricas se pararam e os obreiros saíram à rua junto aos estudantes quando a revolta se converteu num verdadeiro perigo para o Estado francês. Apesar da decadência do movimento obreiro e da paralisia e conservadorismo dos partidos e sindicatos de esquerda era evidente que nenhuma revolução podia levar-se a cabo sem contar com (o que ficava de) a classe obreira, outra questão é a de se essa classe obreira queria sua libertação.
É indubitável que a revolta parisina de maio de 1968 fracassou estrondosamente. Os obreiros regressaram às fábricas, os estudantes à comodidade da casa paterna e a “maioria silenciosa” lhe voltou a dar a maioria nas eleições ao general De Gaulle. Não teve uma repressão tão brutal como a da Comuna de 1871, não se produziu também não a diáspora de revolucionários.
Simplesmente se voltou mansamente à (não)vida de sempre. O capitalismo tinha ganhado uma nova batalha e saía –uma vez mais- reforçado da confrontação. O movimento revolucionário ficou desarticulado e muitos de seus protagonistas se reciclaram e passaram a fazer parte da “esquerda do sistema”.
A I.S. não soube enfrentar sua derrota e foi perdendo membros e idéias a um ritmo crescente a partir de então. Em 1972 se dissolvia com a publicação de um texto, co-assinado por Debord e Gianfranco Sanguinetti[22], no que faziam balanço da obra dos situacionistas e declaravam aberta uma nova época na que as idéias situacionistas se estenderiam e dariam lugar a uma forte corrente revolucionária que mudaria o mundo. O mesianismo de Debord fazia de novo ato de presença, pois era evidente que a situação a começos dos anos setenta era tudo menos revolucionária. A Internacional Situacionista fracassou em suas expectativas de implantação a uma escala ampla de suas teorias, mas a força de sua crítica ao capitalismo espetacular –ou posindustrial ou como queiramos chamar-lhe- lhe reservou um lugar de honra no imenso panteão das revoluções fracassadas.
Alguns aspectos teóricos da Internacional Situacionista: Urbanismo, crítica da arte e vida plena.
“Na linguagem da contradição a crítica da cultura se apresenta unificada: quanto que domina o tudo da cultura –seu conhecimento como sua poesia- e quanto que já não se separa mais da crítica da totalidade social. É esta crítica teórica unificada a única que vai ao encontro da prática social unificada.”
Guy Debord[23]
O conceito principal em torno do qual gira toda a teoria situacionista é o de “vida”, enquanto esta ficou reduzida a uma mera representação e é necessária uma teoria e uma prática que permitam superar essa separação até chegar a sua plena realização livre dos condicionantes que lhe impõe o capitalismo em sua fase espetacular: “Toda a vida das sociedades nas que dominam as condições modernas da produção se apresentam como uma acumulação de espetáculos. Tudo o que era vivido diretamente se aparta numa representação.”[24] Os situacionistas propõem uma rejeição radical às condições de vida que impõe o capitalismo, procuram a realização de uma vida plena e unificada, pelo que sua crítica também será unificada, o que se recusa é a totalidade do sistema capitalista, não um aspecto determinado.
Depois de ter repassado brevemente a história da I.S. é necessário deter-se em algumas das idéias mais importantes dos situacionistas. Aqui se analisarão algumas dessas idéias, mas sem esquecer em nenhum momento que os diferentes aspectos da crítica situacionista não se podem separar uns de outros senão que todos se englobam numa crítica unitária do capitalismo. Três serão os conceitos a tratar: o urbanismo, a crítica da arte e seu conceito de vida.
A I.S. concedeu especial importância à cidade como marco de referência da luta histórica do proletariado por sua emancipação. Desde um primeiro momento as questões relativas ao urbanismo tiveram grande importância nas teses situacionistas, desenvolvendo-se em torno de dois conceitos finque: o urbanismo unitário e a psicogeografía. O urbanismo unitário consistia numa crítica global do urbanismo espetacular, enquanto espaço alienado à vida cotidiana ao ser-lhe imposta uma especialização –forjada sobre a existente divisão do trabalho- e um extrañamiento do meio. A crítica situacionista ao urbanismo procurava uma cidade social e lúdica na que o jogo, a imaginação e a participação social em sua construção fossem um fato[25]. A intervenção prática na cidade por parte dos situacionistas se concretava na psicogeografía e a prática da deriva[26]. Esta prática combinava o aleatório, o “deixar-se levar” através da paisagem urbana, com o estudo de planos e mapas, tudo isso conectando-o com umas supostas variáveis psicogeográficas que influiriam na deriva de modos diferentes segundo as pessoas e as próprias condições do meio urbano. Nas teorias situacionistas sobre a cidade se aprecia de forma clara o grande problema ao que se enfrentou a I.S. Pretendia unificar a crítica teórica da sociedade capitalista e a prática que superasse essa realidade, mas o verdadeiro é que, frente a sua análise acertada e lúcida do urbanismo totalitário, as propostas práticas não passaram em muitos casos de esboços e idéias vadias.
Os situacionistas consideravam que a arte era uma parte mais da sociedade espetacular que tinha do que superar enquanto era um aspecto mais da separação a do que estamos submetidos[27]. Debord, escreveu na sociedade do espetáculo: “O dadaísmo quis suprimir a arte sem realizá-lo; e o surrealismo quis realizar a arte sem suprimí-lo. A posição crítica elaborada depois pelos situacionistas mostrou que a supressão e a realização da arte são os aspectos inseparáveis de uma mesma superação da arte”[28]. Tratava-se de superar a arte como esfera separada da vida, como especialização. A crítica da arte dos situacionistas parte –necessariamente- de uma crítica da divisão do trabalho que compartimenta a vida em esferas e define às pessoas em relação a sua função social, empobreciendo nossas vidas. O corpo central da crítica situacionista da arte pode rastrear-se em pensadores utópicos do século XIX como William Morris[29] e nas vanguardas históricas do primeiro terço do século XX, mas esta concepção da prática artística encontrou sua expressão mais radical nas teorias situacionistas, ao mesmo tempo que tratava de superar as contradições nas que tinham incorrido os dadaístas e os surrealistas[30]. Até que ponto conseguiram os situacionistas superar essa divisão é algo discutível, mas o que é verdadeiro é que encontraram resquícios através dos quais minar a “cultura séria” e superar a separação entre produtor-consumidor de arte. Os meios preferidos para isso foram os happenings e performances e o desvio –plagio- de quadros, fotografias, cartazes publicitários ou histórias em quadrinhos[31].
O situacionismo não conseguiu superar a arte, mas sim conseguiu baixá-lo do pedestal e dar-lhe novas perspectivas críticas, desde então um spray e um cartaz publicitário podem converter-se em instrumentos suficientes para desenvolver um ataque “artístico” contra o sistema. Mas também é verdadeiro que muitas das idéias situacionistas sobre a arte foram recicladas pelo sistema e utilizadas em seu favor. Hoje é habitual ver músicos, anúncios publicitários ou galerias de arte que utilizam -conscientemente ou inconscientemente- recursos desenvolvidos pelos situacionistas como o desvio para vender-nos o último produto de moda. A capacidade do capitalismo para dar a volta às críticas e adaptá-las a suas propostas, descontextualizándolas e eliminando qualquer mensagem crítica é algo que não pode deixar de surpreender a qualquer que tenha estudado um pouco a história dos movimentos anticapitalistas.
Como já se repetiu ao longo deste ensaio, um dos aspectos fundamentais da crítica situacionista é o relativo à crítica da vida segundo as condições que impõe a “sociedade espetacular”. O objetivo dessa crítica procuraria uma realização plena da vida, numas novas condições afastadas do consumismo, a especialização e a separação, o que permitiria a satisfação de nossos desejos[32]. Assim, pode-se falar de um hedonismo situacionista que parte das teorias de Lefevbre sobre a vida cotidiana e do Homo ludens de Huizinga. O jogo terá grande importância nas teorias situacionistas, chegando-se a falar em alguns textos da “revolução como jogo”[33]. Essa busca de uma realização plena da vida há que a ver como uma rejeição total às condições de existência do capitalismo. Rejeição ao tempo de lazer como uma parte mais da separação da vida, como a outra cara –amável- da divisão do trabalho, mas igual de alienante que o resto de condições que nos impõe o capitalismo. Rejeição de um sistema que reduz aos seres humanos a “recursos humanos” intercambiables. Rejeição da “catástrofe cotidiana”[34], em soma, que é ao que reduz a vida a sociedade capitalista.
A reivindicação de uma vida plena frente à (não)vida que impõe a Sociedade do Espetáculo é quiçá a contribuição mais valiosa dos situacionistas à crítica social, mas também pode tornar-se num arma de duplo fio. Como já pusesse de manifesto Ken Knabb, o ludismo situacionista e sua postura “antisacrificio” podem servir como álibi para não render contas e para mudar de jaqueta em qualquer momento[35]. Essa busca da satisfação do desejo, que tem um conteúdo netamente revolucionário nas teses situacionistas, também pode transformar-se em seu contrário, quando se converte na única meta, podendo-se falar de “situacionista egoísta”, aquele que adota uma postura pueril na que o único que importa é a satisfação dos próprios desejos sem ter em conta a situação global da sociedade e descartando a crítica radical da mesma[36].
Esse caráter lúdico passará à maioria de movimentos sociais posteriores, mas totalmente descontextualizado, não é parte de uma crítica coerente senão uma reivindicação por si mesma, o que levará ao paradoxo de que o que era uma crítica à sociedade do espetáculo se transforme numa parte do mesmo espetáculo que se desejava abolir, como sucede com a maioria dos movimentos antiglobalização deste começo do século XXI. Os novos movimentos sociais se caracterizam por seu “simulacro de protesto”, no que prima mais o simbólico do que a ação real. O “buenrollismo político” e o caráter lúdico dos protestos transformam a luta em algo light, num jogo no que a responsabilidade e o compromisso são mínimos, seguindo o lema: “aventura sim, mas sem riscos”[37]. É necessário superar esse dogma sacado de contexto –não se pode entender a reivindicação situacionista da satisfação dos desejos sem inserí-la em sua crítica unitária da sociedade capitalista- para avançar na busca de um mundo novo[38]. A revolução não é um jogo, é algo muito sério.
O legado situacionista: entre a revolução e a assimilação.
“Anúncios publicitáriosque prometem felicidadede algum produto de modaque te fará mudar.Comprador entra na loja,ao espreito o vendedor.Vendedor que vende produto,comprador que vá mamar.
¡Oh, sim, sim! ¡Vos enganam, enganam-vos assim!¡Oh, sim, s!, ¡Vos enganam, enganam-vos as!.”
Eskorbuto[39]
Apesar do fracasso do projeto histórico de superação da sociedade capitalista proposto pela Internacional Situacionista, seu legado pervivió e hoje é mais do que evidente sua influência em numerosos movimentos sociais, políticos e artísticos. A análise do capitalismo posindustrial levado a cabo pelos situacionistas se mostrou extremamente lúcido e acertado em muitos de seus pontos e, apesar de não ter sabido concretar seu “crítica teórica unificada” numa “prática social unificada”, as idéias situacionistas seguiram animando o debate político antagonista até os começos deste século XXI, mostrando como muitas de suas idéias se adiantaram a seu tempo.
Um dos movimentos nos que mais facilmente se pode rastrear a influência situacionista é no punk. Conquanto está influência com freqüência pôde ser magnificada[40], é evidente que as teorias situacionistas, bem por via direta ou –mais freqüentemente- indirecta, influíram em grande parte no punk. No desenvolvimento do punk na Inglaterra dos anos setenta tiveram grande importância dois personagens que conheciam as idéias situacionistas e que contribuíram a sua introdução no movimento, conquanto a maioria de jovens punks não tinham a menor idéia de quem era Guy Debord. Tanto Jaime Reid, desenhista das portadas de Sex Pistols como Malcolm McLaren, sua manager, tinham entrado em contato com os situacionistas e através deles se introduziram as teorias situacionistas no punk[41], o que foi posteriormente ampliado por grupos que sim tiveram um contato mais direto com as idéias situacionistas e com outros movimentos artísticos e políticos, como os anarcopunks Crass. Questões como a superação do papel músico/espectador, a rejeição da indústria cultural por meio da cultura do “Do It Yourself” (D.I.E.) ou a imediatez –queremos a revolução e a queremos agora- têm evidentes pontos de conexão com as teorias situacionistas, bem como com outros movimentos vanguardistas do século XX, desde Dadá ao Neoísmo, passando por fluxus ou o mail art.
Esta influência situacionista foi rapidamente desvirtuada pelas ânsias de dinheiro fácil e fama de grupos como Sex Pistols e oportunistas como McLaren. A denúncia do Espetáculo foi substituída pela assimilação ao mesmo. Era mais importante sair na televisão provocando, de maneira simplista, às anciãs com uma estética e uma atitude violenta e nihilista que denunciar as contradições do sistema e procurar a raiz dos problemas e as faltas de expectativas sociais para construir uma realidade diferente. A isso se uniu a chegada do neoliberalismo da mão de Reagan e Tatcher que desembocou na década dos oitenta num ambiente de desesperanza generalizado, era o Não Future em estado puro. Mesmo assim, pode-se rastrear uma herança situacionista –mais fiel a seus princípios- no punk e seus derivados até a atualidade.
Para concluir, é necessário dizer que as idéias situacionistas têm uma vigência e uma atualidade inegáveis –por desgraça- no momento atual de desenvolvimento do capitalismo, conquanto, algumas de suas teses se mostraram errôneas e alguns aspectos da evolução do capitalismo não receberam o atendimento necessário por parte dos situacionistas. A violência técnica à que estamos submetidos é hoje o principal problema ao que nos enfrentamos, já que reduz as possibilidades da crítica, ao vender-nos que vivemos no melhor dos mundos possíveis e do que só tenderá a melhorar se nos deixamos levar da mão da tecnificación e a artificialización, mas a realidade é que isto só conduz à sinrazón, a uma pseudovida que não é mas que um sucedâneo adulterado do que significa a vida humana[42]. É o fim da história. O Espetáculo se apresenta como inevitável e qualquer oposição se recusa como estéril, como uma postura romântica mas inútil. Hoje somos mais escravos que nunca, já que a possibilidade de mudar nosso modo de vida e as condições sociais da mesma se apresentam mais longínquos do que em nenhum outro momento da história.
O grande erro da I.S. foi o de não ter sabido dar o passo definitivo para uma prática que supusesse uma alternativa real ao sistema capitalista, aproveitando as contradições do próprio sistema. Essa tarefa inacabada pode considerar-se o fracasso das teorias situacionistas, mas também pode ser o germe a partir do qual possa surgir um novo fermento emancipatorio que supere a teoria situacionista ali onde esta fracassou, isto é, realizando-a. O triunfo das teses situacionistas passará por sua superação como meio de supressão do Espetáculo. Para isso existe a história, para aprender dela e por isso os apologistas do capital anunciam felizes seu fim. O fim da história será o fim da possibilidade de emancipação da humanidade. Não o permitamos.
Recuperemos a história e façamos história. ¡¡Recuperemos nossas vidas!!
NOTAS:
. [1] André Gide: O inmoralista, Argos Vergara, Barcelona, 1981, p. 13
. [2] Miguel Amorós: “Tecnologia e dissolução de classes”, As armas da crítica, Likiniano elkartea, Bilbao, 2004, p.40
. [3] Stewart Home: O assalto à cultura. Correntes utópicas desde o Letrismo a Class War, Vírus, Barcelona, 2002, p. 17
. [4] Theodor W. Enfeite: Teoria estética, Akal, Madri, 2004, p. 13
. [5] É certo nada mais terminar a Segunda Guerra Mundial tinham começado a surgir novos movimentos artísticos, aos que teria que adicionar os movimentos clássicos que sobreviveram à guerra como o surrealismo –conquanto muito dividido e debilitado-, mas se pode afirmar sem temor a errar que o grupo COBRA foi a primeira grande vanguarda do pós-guerra.
. [6] Stewart Home: op.cit., p. 46
. [7] Um esboço destas idéias se pode encontrar em: N. Constant: “Outra cidade para outra vida”, Internacional Situacionista. Textos completos em castelhano da revista Internationale Situationniste (1958-1969), vol.1. A realização da arte, Literatura cinza, Madri, 2001, pp. 106-109
. [8] Esta poderia ser uma das razões que explicam o fracasso das vanguardas da segunda metade do século XX e o porquê de que muitos de seus integrantes tenham acabado abraçando posturas conservadoras em sua maturidade. A rebeldia é aceitada para a juventude e considerada loucura na maturidade.
. [9] O motivo da ruptura foi a irrupção de um grupo de letristas numa conferência de imprensa de Charles Chaplin, o que provocou a condenação pública de Isou, ao que os dissidentes responderam com um comunicado no que se constituía o novo grupo. Stewart Home: op. cit., p. 57
. [10] Guy Debord e Gianfranco Sanguinetti: “Tese sobre a Internacional Situacionista e seu tempo”, apêndice a Internacional Situacionista. Textos completos em castelhano da revista Internationale Situationniste (1958-1969),vol.3. A prática da teoria, Literatura cinza, Madri, 2001 # , 60, p. 682
. [11] O nome remete à prática da “construção de situações”, entendendo que uma situação construída é um “momento da vida construído concreta e deliberadamente para a organização coletiva de um ambiente unitário e de um jogo de acontecimentos”, em: “Definições”, Internacional Situacionista. Textos completos em castelhano da revista Internationale Situationniste (1958-1969), vol.1. A realização da arte, p.14
. [12] Stewart Home: op. cit., pp. 77-8
. [13] César De Vicente: “Introdução” a Discurso sobre a vida possível. Textos situacionistas sobre a vida cotidiana, Hiru, Hondarribia, 1999, pp. 8-9
. [14] Ibídem, p. 14
. [15] O texto íntegro em castelhano se pode encontrar no Arquivo Situacionista Hispano em internet: http://sindominio.net/ash/miséria.htm
. [16] “Nossos fins e nossos métodos no escândalo de Estrasburgo”, Internacional Situacionista. Textos completos em castelhano da revista Internationale Situationniste (1958-1969),vol.3. A prática da teoria, 486-93
. [17] René Viénet: Enragés e situacionistas no movimento das ocupações, http://sindominio.net/ash/enrages.htm
. [18] Ken Knabb: “A sociedade do situacionismo”, Segredos a vozes, Literatura cinza, Madri, 2001, p. 46
. [19] Guy Debord: A sociedade do espetáculo, Maldeojo, s.f., #121, p.52 Utilizo a versão pirata de Maldeojo frente à “legal” de Pré-Textos. Para uma discussão sobre a tradução veja-se: “Tradução defeituosa da sociedade do espetáculo”, http://sindominio.net/ash/esptrad.htm
. [20] Raoul Vaneigem: “Aviso aos civilizados com respeito à autogestión generalizada”, Internacional Situacionista. Textos completos em castelhano da revista Internationale Situationniste (1958-1969),vol.3. A prática da teoria, pp. 600-6
. [21] Ken Knabb: op. cit., p. 52
. [22] Guy Debord e Gianfranco Sanguinetti: “Tese sobre a Internacional Situacionista e seu tempo”, apêndice a Internacional Situacionista. Textos completos em castelhano da revista Internationale Situationniste (1958-1969),vol.3. A prática da teoria, pp. 655-85
. [23] Guy Debord: A sociedade do espetáculo, # 211, p. 85
. [24] Ibídem, #1, p.3
. [25] N. Constant: “Outra cidade para outra vida”, em Internacional Situacionista. Textos completos em castelhano da revista Internationale Situationniste (1958-1969), vol.1. A realização da arte, pp. 106-109; Attila Kotányi e Raoul Vaneigem: “Programa elementar do escritório de urbanismo unitário”, em Internacional Situacionista. Textos completos em castelhano da revista Internationale Situationniste (1958-1969), vol.1. A realização da arte, pp. 211-13
. [26] No primeiro número da revista Internationale Situationniste se dão as seguintes definições de “psicogeografía” e de deriva. Psicogeografía: “Estudo dos efeitos precisos do meio geográfico, ordenado conscientemente ou não, ao atuar diretamente sobre o comportamento afetivo dos indivíduos.” Deriva: “Modo de comportamento experimental unido às condições da sociedade urbana; técnica de passagem ininterrupto através de ambientes diversos. Usa-se também mais especificamente para designar a duração de um exercício contínuo desta experiência.” em Internacional Situacionista. Textos completos em castelhano da revista Internationale Situationniste (1958-1969), vol.1. A realização da arte, p. 15
. [27] Seção inglesa da Internacional Situacionista: A revolução da arte moderna e a arte moderna da revolução, Pepitas de abóbora, Logronho, 2004
. [28] Guy Debord: A sociedade do espetáculo, #192, p. 78
. [29] William Morris: “A arte sob a plutocracia”, Como vivemos e como poderíamos viver. trabalho útil ou esforço inútil. A arte sob a plutocracia, Pepitas de abóbora, Logronho, 2004
. [30] Segundo Theodor W. Enfeite, na prática das vanguardas clássicas se produziria um paradoxo, ao chocar a liberdade criativa que propugnavam com a perda de liberdade “no tudo”, isto é, no resto de âmbitos da vida, produzindo-se uma maior separação de arte e vida, Theodor W. Enfeite: op.cit., pp.9-10
. [31] René Vienet: “Os situacionistas e as novas formas de ação na política e a arte”, Internacional Situacionista. Textos completos em castelhano da revista Internationale Situationniste (1958-1969), vol.3. A prática da teoria, pp. 494-6
. [32] “A direção realmente experimental da atividade situacionista é o estabelecimento, a partir de desejos mais ou menos conhecidos, de um campo de atividade temporária favorável a estes desejos. Isso só pode trazer consigo o esclarecimento dos desejos primitivos e a aparição confusa de outros novos, cuja raiz material será precisamente a nova realidade constituída pelas construções situacionistas.”, nota editorial ao número 1 de Internationale Situationniste: “Problemas preliminares à construção de uma situação”, em Internacional Situacionista. Textos completos em castelhano da revista Internationale Situationniste (1958-1969), vol.1. A realização da arte, p.12
. [33] Seção inglesa da Internacional Situacionista: op. cit., p. 57 e ss.
. [34] Andrés Devesa: “Catástrofe espetacular e catástrofe cotidiana”, Re-Evolução, 1, 2005, pp. 9-11
. [35] Ken Knabb: “A realização e a supressão da religião”, op. cit., p. 70
. [36] Um caso paradigmático é o do ex-situacionista Raoul Vaneigem, máximo expoente desse hedonismo pueril e absurdo, Ibídem, p. 73
. [37] Miguel Amorós: “Quando o real se volta ilusório”, op. cit. pp. 9-14
. [38] “Para uma crítica efetiva da sociedade capitalista será necessário passar acima de um dos grandes dogmas do izquierdismo (pos)moderno, o hedonismo, que faz de todos nossos desejos imperativos categóricos que devem ser satisfeitos so pena de converter-nos em seres alienados por categorias passadas de moda como o ou o .”, Os Amigos de Ludd: “Se abre passo a crítica anti-industrial?”, Os Amigos de Ludd, 8, 2005, p. 3
. [39] “Vos enganam”, canção do disco Eskizofrenia de Eskorbuto.
. [40] Stewart Home: op. cit., p. 164
. [41] “Jaime Reid, em seu trabalho como desenhista, recuperou velhos cartazes situacionistas dando-lhes uma nova e livre versão. Assim, o pôster Atelier populaire de maio do 68 se convertia no God Save The Queen, onde a sagrada imagem da rainha de Inglaterra esburacava seus lábios com um grande imperdível”, Servando Rocha: “Punk e vanguarda contracultural. Mail art, situacionismo, futurismo e fluxus. O sabotagem à cultura séria”, A Felguera, 11, 2005
. [42] Para uma análise em profundidade do que significa e implica a artificialización e para uma crítica à industrialização forçada é conveniente conferir algum dos números do boletim de informação anti-industrial editado pelos Amigos de Ludd, especialmente interessantes para o tema aqui esboçado são os artigos: “Notas preliminares”, Os Amigos de Ludd, 1, 2001, pp. 1-5. e “Que fizestes de vossas vidas?”, Os Amigos de Ludd, 4, 2002, pp. 1-5 http://fcuatrocincouno.blogspot.com
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